Enquanto andava e dormia, que é o meu estado natural de estar - a andar e a dormir - lembrei-me, se calhar porque a Chan Marshall mo gritava aos ouvidos - e sim, passaram dois dias e continuo sem a conseguir deixar partir - que o que eu vou fazer (e vou, um dia...), é ir à tua casa, - onde quer que isso seja - e vou bater à porta, vou bater à porta com a legitimidade de quem nunca se foi embora, e se não estiveres em casa, eu mando a porta abaixo, e entro. Entro, com o à-vontade de quem todos os dias de manhã se passeia por aqueles corredores em roupa interior antes de ir para o trabalho e toma café naquela banca de cozinha todos os Domingos a seguir ao almoço e partiu aquela cadeira velha (um bocadinho de propósito porque ela era feia) que tu trouxeste de casa da tua mãe. E tu vais chegar a casa, ver a porta no chão, sentir o cheiro dum perfume estranho - sim, eventualmente eu vou deixar de usar aquele perfume que me deste do qual eu nem gosto - e vais ficar assustado, preocupado, desconfiado, agressivo, defensivo, irritado, sobressaltado, e quando chegares à sala e me vires sentada a dormir com a boca aberta no teu sofá onde nunca ninguém para além de ti se sentou (nem a tua nova amiguinha) com a televisão ligada naquelas séries que eu via e tu odiavas, com a tua chávena de café cheia de whisky em cima da tua mesa sem as tuas protecções para os copos, vais gritar o meu nome e mandar com o que tiveres nas mãos para o chão, vais-me acordar, vais-me puxar violentamente da cadeira, vais-me perguntar "mas que raio é isto?!?" e eu vou responder "NÓS SÓ QUERÍAMOS QUE TU GOSTASSES MAIS DE NÓS!!!" e tu vais responder furioso "O quê Joana?! 'Nós' quem?!?" e eu vou responder no tom mais calmo do mundo "A questão não é essa, Tiago José!".

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